APL 83 Frei Comilão

Em tempos de Dom João III, havia no convento de Anseade um frade que estava sempre muito disposto para comer, e pouco para rezar. A dirigir-se para o refeitório era o primeiro, para o coro era o último.
 Quando os superiores o repreendiam, respondia plácida e invariàvelmente:
 — Muito comer, pouco rezar e nunca pecar leva a alma a bom lugar.
 Um dia os frades resolveram preparar um beberete e ir tomá-lo a Oliveira, mas, como receavam o excessivo consumo de Frei Comilão não lhe disseram nada.
 Este porém, que para coisas de tal espécie devia ter um sexto sentido, percebeu a astúcia dos seus irmãos e, antecipando-se-lhes, partiu para Oliveira.
 Quando chegou junto do rio, viu que não tinha barco que o levasse à outra margem mas o apetite parece que é engenhoso pois Frei Comilão teve uma ideia: tirou o capote monástico, estendeu-o no rio e nele navegou até à outra banda mais feliz, sem dúvida, na sua bizarra embarcação de que os marinheiros da Nau Catrineta, que só tinham sola de molho enquanto que o monge de Ansede tinha a esperança de rica merenda.
 Quando os outros frades chegaram a Oliveira, ficaram desapontados!
 ... E Frei Comilão a saborear como aperitivo aquele desapontamento enquanto repetia com a calma habitual:
 — Muito comer, pouco rezar e nunca pecar, leva a alma a bom lugar.

Source
PINTO, Maria Luisa Carneiro Por Terras de Baião Porto, sem editora, 1949 , p.181-183
Place of collection
BAIÃO, PORTO
Narrative
When
20 Century, 40s
Belief
Some Scepticism
Classifications

Bibliography