APL 663 Malpica

No sítio onde hoje alveja, branquinha, a capela de Nossa Senhora das Neves, ali na margem direita do rio Tejo, entre Monforte e Malpica, existiu outrora um pequeno povoado.
 De ruas bem abertas a nascente, indiferente ao grande bulício do Mundo, laboriosa e confiante, a sua população foi-se multiplicando e o lugar crescendo de importância.
 Mas, como em tempos e idades recuadas as correntes étnicas, as raças se delimitaram pelos grandes acidentes de terreno, pelos mares, pelas serras e pelos rios, do lado de lá do Tejo veio a morar população diferente e de interesses opostos.
 Por ambição ou maus instintos, em consequência de guerras ou de rivalidades, os de lá — no dizer do povo, os Castelhanos — por mais de uma vez transpuseram o grande rio para virem saquear o pequeno povoado.
 E, um dia, não contentes com o assalto, semearam a destruição e a morte, e trucidaram grande número ou a quase totalidade dos moradores.
 Os sobreviventes, que já por mais de uma vez tinham posto o problema, chegaram finalmente ao convencimento de que a povoação não podia permanecer naquele lugar e que se tornava absolutamente necessário mudá-la para sitio que a pusesse a coberto dos assaltos dos vizinhos.
 Reunidos todos para resolverem o problema, as opiniões divergiram, apresentando cada qual o seu alvitre.
 E depois de muito discutirem, acabaram por aprovar a ideia de se confiarem à sorte.
 Para tanto, combinaram que a nova povoação fosse edificada no local onde uma vacada, deixada em plena liberdade, se fosse fixar.
 Abandonada esta, e acompanhada de longe com certa ansiedade pelos moradores, verificaram que parou, dormiu e permaneceu no sitio onde hoje é a praça de Malpica.
 Os sobreviventes do velho lugar, entre surpresos e desiludidos, reconheceram que não fora feliz o processo de escolha, porquanto, se a antiga posição não era boa, a nova não era melhor: igualmente aberta e igualmente indefensável.
 Mas, fatalistas, certos de que «o que tem que ser tem muita força», iniciaram, sem perda de tempo, a construção da nova povoação.
 E, dizendo mal fica, mal fica, deram o nome ao povoado que, com o andar dos tempos, veio a chamar-se Malpica.

Source
DIAS, Jaime Lopes Contos e Lendas da Beira Coimbra, Alma Azul, 2002 , p.74-75
Place of collection
Malpica Do Tejo, CASTELO BRANCO, CASTELO BRANCO
Narrative
When
20 Century, 50s
Belief
Unsure / Uncommitted
Classifications

Bibliography